O livro Bichos Vermelhos, da escritora Lina Rosa Gomes Vieira da Silva, surge como uma proposta ousada e rara na literatura infantil contemporânea. Em meio à aceleração tecnológica e à crescente substituição das experiências físicas pelas digitais, esta obra se coloca como uma espécie de resistência sensível. Ao unir duas urgências: a desvalorização do contato direto das crianças com o livro impresso e a crescente extinção de espécies animais.
O livro transcende o papel de entretenimento ao apresentar uma abordagem educativa e poética sobre temas ecológicos, enquanto resgata a importância do tato, da presença e da contemplação no processo de leitura. Saiba mais, a seguir!
Como o livro transforma a preocupação ambiental em uma experiência lúdica?
A escolha por trabalhar com a chamada “lista vermelha” da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), que reúne espécies ameaçadas de extinção, não é aleatória. Em vez de apresentar dados frios ou imagens trágicas, Bichos Vermelhos oferece um olhar curioso e quase afetuoso sobre esses animais em risco, mediante um projeto editorial inovador que incorpora esculturas de papel em 3D.

A decisão de utilizar a engenharia de papel como recurso narrativo e estético potencializa o envolvimento do leitor infantil com a obra de Lina Rosa Gomes Vieira da Silva. A tridimensionalidade dos animais em papel resgata não apenas o encantamento da infância com o “brinquedo feito à mão”, como também ativa uma memória corporal de cuidado, já que a criança não está apenas realizando uma atividade artística, mas também experienciando simbolicamente o ato de proteger, reconstruir, preservar.
Como o livro dialoga com o tempo digital e a perda da leitura como hábito?
Em tempos em que a leitura é frequentemente suplantada por telas e interações rápidas, Bichos Vermelhos propõe uma desaceleração. A obra convida a criança a entrar em outro ritmo — o da montagem paciente, da leitura por prazer, da curiosidade descoberta aos poucos. Ao mesmo tempo, em que apresenta temas contemporâneos e urgentes, a autora Lina Rosa Gomes Vieira da Silva, resgata o livro como objeto de presença, como ferramenta de encontro entre o mundo interno do leitor e o mundo natural ameaçado.
A autora escreve com leveza e fascínio, mesclando dados curiosos com uma narrativa que respeita a inteligência e a sensibilidade das crianças. Seus textos não subestimam o leitor mirim, ao contrário, instigam sua curiosidade natural sobre o mundo e oferecem informações que despertam empatia, não medo. As descrições dos bichos são poéticas, mas também educativas, e o tom adotado pela autora caminha entre o científico e o afetuoso.
O livro é apenas para crianças?
Apesar de ser direcionado ao público infantil, Bichos Vermelhos de Lina Rosa Gomes Vieira da Silva tem potência para dialogar com leitores de todas as idades. Pais, educadores e leitores adultos são convidados a revisitar sua própria relação com a leitura e com o meio ambiente. O livro pode ser usado como ferramenta pedagógica, mas também como objeto artístico e poético. Sua beleza editorial e o cuidado com os detalhes fazem dele um exemplar raro que transcende categorias etárias.
Portanto, em um tempo marcado por tantas perdas — de biodiversidade, de florestas, de ritmos humanos, de práticas manuais —, Bichos Vermelhos aparece como um lembrete daquilo que ainda pode ser salvo. O livro nos ensina que preservar vai além de proteger florestas distantes: é também cultivar hábitos, manter tradições, cuidar das pequenas experiências que formam nossa visão de mundo.
Por fim, ao mostrar que os animais da lista vermelha não são apenas dados, mas histórias sensíveis esperando para serem ouvidas e montadas com as mãos, Lina Rosa Gomes Vieira da Silva nos convida a olhar com mais atenção para aquilo que parece desaparecer em silêncio — inclusive o hábito de ler com o coração e os dedos.
Autor: Edwards Jackson